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“Aqui a Internet é viver a vida como ela é”

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Por mais de 40 anos, Santo Gislon acordou muito antes de o sol raiar, com os galos cantando, e saiu para a roça trabalhar na comunidade de Terceira Linha. Na época, nada dos maquinários modernos que existem hoje. Era com as próprias mãos que ele plantava e colhia o fumo, o feijão e diversas outras culturas. Casou em 1969 com Maria Borges Gislon e ganhou do pai alguns poucos hectares de terra. “Depois dali, tive que me virar para conseguir o pão de cada dia”, relata ele afirmando que, naquela época, nada vinha de ‘mão beijada’.

O orgulho de poder mais um ano comemorar o Dia do Colono [24 de julho] está estampado no rosto de seu Santo. Para as novas gerações, ele deixa um recado. E diz que feliz foi ele, por ter tido a oportunidade de apreciar a vida sem ser alienado pelo mundo de hoje. “Se eles soubessem como é ser feliz trabalhar na roça, não iriam buscar outros meios de viver. Essa é a minha alegria, dos meus netos e da minha família. Sinto muito orgulho da história que escrevi e do legado que deixarei”, enaltece.

Teve três filhos que foram criados e vivem até hoje na agricultura. Aos 71 anos de idade e já aposentado, diz que chegou a hora do descanso e passou o comando para Edson, Edir e Sônia. “Mas continuo levantando cedo, não tanto como antigamente claro, para cuidar da minha plantação. Tenho uma horta em casa e tudo o que comemos é sem veneno, sem agrotóxico. Ser agricultor, é a melhor coisa do mundo”, orgulha-se.

Seu Santo e dona Maria começaram cedo a trabalhar. Com nove anos tinham que conciliar os estudos com os serviços na agricultura, ao lado dos pais. Além de encontrar um tempo para sair correndo pelos quatros cantos, subir em árvores e se aventurar nas brincadeiras que só quem viveu na época, conhece bem. Os filhos foram criados da mesma forma. E desde cedo aprenderam a valorizar o dinheiro de cada dia, tendo a consciência de que o retorno só vinha, depois de muita batalha e dedicação.

Para seu Santo, o futuro da agricultura é incerto. Segundo ele, a realidade já é muito diferente daquela que ele, a esposa e os três filhos foram criados. “Nós éramos felizes, trabalhávamos com gosto e cada novo dia era uma alegria. Hoje as coisas são muito diferentes. Não existe incentivo do governo e parece que ao invés de ajudar, eles só querem prejudicar. Por exemplo, eu tenho cinco netos e, se algum deles for encontrado perto da plantação, nós levamos uma multa. Eles só querem multar e multar ao invés de deixar o agricultor trabalhar”, relembra saudoso.

O filho Edson, de 41 anos, diz não ter dúvida que no futuro vai faltar alimento. “Eu cresci, brinquei muito por essas terras, trabalhei com meus pais desde pequeno e isso não fez de mim uma pessoa pior. Pelo contrário, aprendi cedo que é preciso trabalhar, suar a camisa. Hoje, um adolescente de 15, 16 anos não pode fazer isso, é proibido. É muita burocracia para pouca lógica. Enquanto isso, vão vagabundear pelas ruas. Não consigo entender que lei é essa. E quando a geração do meu pai acabar? E a minha? Quem vai ser agricultor? O que vai ser da agricultura?”, questiona.

Em pleno século XXI, o que as crianças mais querem é ganhar o videogame de última geração de aniversário. Ou ter um tablete igual ao do amiguinho da escola, e também não pode faltar o celular mais moderno. A verdade é que a maioria das crianças de hoje estão mais ligadas no mundo tecnológico do que muitos adultos. Rodrigo, porém, neto de seu Santo, diz que as coisas não funcionam bem assim. Para ele, bom mesmo é calçar a bota sete léguas e sair pelas ruas brincando de bola, bicicleta e tudo mais que uma criança que vive no mundo rural tem direito. Celular? Computador? Isso não faz a sua cabeça.

“Eu gosto de brincar na rua, na roça. De carrinho, bicicleta. É muito mais legal do que ficar dentro de casa mexendo em um computador”, garante. “Aqui, temos telefone só por necessidade”, acrescenta o tio Edson. O avô diz saber que a Internet é importante para a educação, mas que muito mais importante do que isso, é aprender a viver. “Não adianta também querermos ficar parado no tempo. Eles estudam, só tiram nota boa. Mas tem que brincar na rua, como a gente fez a vida inteira. Aqui, a internet é viver a vida como ela é. Não tem nada melhor do que poder respirar esse ar puro e sair pela rua pulando despreocupado”, afirma o avô coruja.