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Economia

Crise política, austeridade fiscal e ortodoxia

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Quem entendeu as lições de Keynes, sabe muito bem que o antídoto para uma crise econômica da envergadura de 2008 não se recomenda austeridade fiscal. Pelo contrário, recomenda-se uma política anticíclica de coordenação estatal e gastos públicos enterrando garrafas pela manhã e desenterrando ao final do dia.

Com a queda do Ministro da Fazenda Antonio Palocci (março de 2006) e a nomeação de Guido Mantega, a ortodoxia perdeu força e o keynesianismo começou a ganhar espaço dentro do governo frente ao turbilhão da crise financeira norte-americana detonada em meados de 2007, sob fogo cruzado, para evitar a recessão e também a derrocada do governo.

Um conjunto de medidas anticíclicas foram implementadas para isso, tais como: elevação do salário mínimo; aumento do crédito à pessoa física e jurídica; ampliação dos programas de transferência de renda; desoneração tributária (de 13% da arrecadação federal em 2007 para 20% em 2010); as estatais voltaram a ocupar lugar de destaque, sobretudo Petrobrás e Eletrobrás; os gastos públicos foram potencializados com destaque para o programa Minha Casa Minha Vida e recuperação da indústria naval; e um conjunto de investimentos em infraestruturas foram anunciados.
Se por um lado houve um entesouramento privado dado à incerteza, por outro o governo criou demanda efetiva. Foi montada uma política anticíclica que fortaleceu a dinâmica interna a ponto que “Lá fora (a crise), é um tsunami; aqui, se ela chegar, vai chegar uma marolinha que não dá nem para esquiar.” (Lula, 2008).

Os caminhos percorridos pela política econômica entre 2007-2014 resultaram num crescimento acumulado de 26,8%, o que da uma média anual de 3,8%. Em 2009 quando a crise foi mais forte, o crescimento foi negativo (-0,2%) e a geração de emprego foi de 400 mil a menos que 2008 (1,2 milhões em 2009 e 1,6 milhões em 2008).

Já em 2010, a política anticíclica resultou num crescimento de 7,6%, o maior desde 1985 e uma geração de emprego recorde, 2,5 milhões. Olhando para os indicadores macroeconômicos nesse período, houve uma queda da taxa de desemprego de 9,3% para 4,3%, a menor da história e uma elevação do salário mínimo (sempre acima da inflação) de R$ 380,00 para R$ 724,00. Porém isso os poucos foi provocando uma banalização do ódio de classe.

A estratégia de atuação estatal recolocou o crescimento, a distribuição de renda e a política social no centro da agenda governamental. Gradualmente o índice de Gini foi recuando (de 0,589 em 2003 para 0,501 em 2011) e a massa de miseráveis que representava 24,1% em 2002 caiu para 7,4% e a baixa classe média passou de 29,3% para 43%.

Mesmo sem mexer no modelo de gestão da dívida pública, o governo Dilma Rousseff cutucou a onça com vara curta ao reduzir a taxa Selic (7,25% a.a. out/2012), estabelecer controle de capitais, impor IOF sobre os investimentos estrangeiros de portfólio e ao reduzir do spread bancário. Segundo a presidente (2012), “É inadmissível que o Brasil, que tem um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos, continue com um dos juros mais altos do mundo. Esses valores não podem continuar tão altos. O Brasil de hoje não justifica isso”.

Por isso ela acabou sendo eleita pela Ibovespa a pior presidente da história, desde 1969. Portanto é passível a discussão do distanciamento da postura ortodoxa, sobretudo governo Lula II e Dilma I. Assim como a troca do Ministro Palocci por Mantega representou uma mudança na trajetória política do governo Lula, a escolha de Joaquim Levy representa uma nova mudança no governo Dilma.

Em 2015, o debate político foi reposicionado e os caminhos trilhados pela política econômica são distintos dos anos anteriores. A escolha de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda reacendeu a ortodoxia dentro do governo e enfraqueceu o keynesianismo. Se o objetivo era acalmar os ânimos do mercado financeiro depois de uma acirrada campanha eleitoral, acabou contrariando parte expressiva da militância petista, da esquerda e dos movimentos sociais.

A gota d’água veio com o anúncio do ajuste fiscal. Num ambiente onde o setor privado esta segurando novos investimentos e novas combinações, o governo ao segurar o investimento público contribui para o agravamento da recessão. O governo segurando seus gastos inibe a demanda efetiva o que lá na frente resultará em queda da arrecadação. Por consequência, a meta fiscal será frustrada.

Anunciado em junho pela Fazenda, o ajuste fiscal não chegou à primeira esquina, fracassando logo na arrancada. Uma economia em recessão cíclica onde a arrecadação federal sofre uma queda real de 3,72% entre jan/set-2015 quando comparado com o período passado, acabou comprometendo a meta do ajuste fiscal de 0,6% do PIB, ou R$ 66,3 bilhões, fazendo com que meta fosse reduzida para 0,15% do PIB, ou R$ 8,74 bilhões.

Semanas depois o governo ainda anunciou que em 2015 terá um déficit primário de R$ 51,8 bilhões, o equivalente a 0,9% do PIB, podendo chegar a R$ 110 bilhões caso do TCU determine que o governo a tenha que quitar sua dívida com os bancos públicos. Porém a questão é que a fragilização do governo Dilma e a infantilidade da oposição golpista têm prejudicado o investimento que teve uma queda de 10,5% nos dos primeiros trimestre de 2015 e repercutido no aumento da taxa de desemprego de 4,3% em dez/2014 para 7,6% em ago/2015, a maior desde 2009.

Para agravar, o resultado esperado para o PIB no final do ano é negativo. Como nos ensinou Keynes, é a decisão de gasto que vai determinar a renda, o emprego e o crescimento, do contrário, o efeito é negativo. O ajuste fiscal astuto proposto pelo governo fracassou. Mas isso não significa que a ortodoxia macabra também fracassou e que retomaremos ao social-desenvolvimentismo.

A ortodoxia está atacando em outras frentes, como na flexibilização e precarização das relações de trabalho com redução do salário, na retirada de um conjunto de direitos sociais conquistados pela massa de trabalhadores ao longo da última década e no desachatamento a classe alta e média em relação à massa de trabalhadores. O ataque dos “austericidas”[1] passa a ser a Constituição Federal de 1988, pois entendem que a mesma já não cabe mais ao orçamento federal. No seu conjunto, a ausência de uma política econômica pró-ativa e o afinamento ortodoxo da Fazenda tem paralisado a economia e fragilizado o “lulismo”.